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«Eu continuo a ser um miúdo que cresceu na rua»

DUARTE GRILO. No momento em que assinala 10 anos de percurso profissional, não faltam projetos ao ator. Com repetidas experiências além-fronteiras, tem mantido com regularidade um trabalho que passa pelo teatro, pelo cinema e pela televisão. Nada que lhe tire a boa disposição e a energia que contagia quem o rodeia.

O que é que estás a fazer neste momento?

Neste momento estou a fazer o Macbeth, com a Companhia do Chapitô. Andamos em tournée internacional há dois anos. Fazemos o espetáculo em três línguas, o que nos permite correr o mundo todo. Além disso, estou a preparar uma curta-metragem com um realizador já premiado e com o qual eu já trabalhei.

Assinalas, neste 2017, 10 anos de percurso profissional de ator. Durante este tempo, tens tido repetidas experiências em televisão, cinema e teatro...

Onde trabalho mais é em teatro e cinema. Tenho a sorte de pertencer à Companhia do Chapitô que me permite ter vindo a fazer muito teatro, uma vez que é uma companhia com um grande peso e com trabalho muito constante e regular. Além disso tenho feito também muito cinema e depois, de vez em quando, faço televisão. O meu maior volume de trabalho é em teatro e em cinema.

Mas nunca deixas de fazer nenhuma destas três vertentes. Trabalhas com regularidade nas três.

Sim, sim. Sem dúvida.

És feliz nos três registos?

Sou, de diferentes maneiras, mas sou.

Porquê?

No teatro há uma reação imediata. Sente-se automaticamente se a coisa está a correr bem ou mal, se as pessoas gostam, se acham graça, se se identificam... Há uma resposta imediata ao nosso trabalho. No teatro, ao contrário da televisão e do cinema, as pessoas vêm o que querem, não vêm o que a câmara mostra. A margem de erro é muito diferente e é aí que reside toda a adrenalina do teatro.

E no cinema?

O cinema é algo que nos permite mergulhar a fundo no personagem. Muito, muito fundo. Normalmente sabemos dos personagens com antecedência, então podemos fazer um trabalho de grande construção. No teatro também, mas eu encontro mais a felicidade da ação-reação. No cinema, o que mais gozo me dá é o processo e não o que acontece a seguir.

E em televisão, o que é que mais gostas?

Televisão é, basicamente, uma lufa-lufa de trabalho em que temos de responder no imediato e à primeira àquilo que esperam de nós. Obriga o nosso cérebro a estar constantemente em alerta. Há muitas cenas para decorar diariamente. Obriga-nos a trabalhar a um outro ritmo e isso é muito bom. É uma escola ótima, porque se conseguimos trabalhar nesse ritmo, mais tarde, no trabalho em teatro ou em cinema, conseguiremos fazer um trabalho muito mais pormenorizado. Acho que é isso... teatro, cinema e televisão dão-me muita pica por diferentes motivos.

E nestes 10 anos fizeste um caminho que não se desviou só para um registo. Foste sempre fazendo os três, quase sem parar.

Sim. O máximo de tempo que estive parado foi para aí uns três meses...

E agora num exercício de futurologia, diz-me: onde é que te imaginas nos próximos 10 anos?

Muito sinceramente, imagino-me a trabalhar fora do país que é o que tem vindo a acontecer cada vez com mais regularidade. As oportunidades que me são dadas acontecem, cada vez mais, lá fora. Acaba por ser mais confortável a nível financeiro e a nível criativo também.

E isso entusiasma-te?

Entusiasma-me muito. É uma meta. Os atores são veículos para contar uma história e a quanto mais pessoas isso chegar, melhor. Este é o caminho que tenho vindo a tentar delinear. O meu trabalho não se resume às longas-metragens alemãs ou inglesas, de todo. Por exemplo, o meu trabalho na Companhia do Chapitô também me leva muitas vezes para fora. O Macbeth, por exemplo, que está há dois anos em digressão internacional, cá em Portugal esteve duas semanas em cena, mais coisa, menos coisa. O mercado internacional é muito mais aberto às artes do que Portugal.

Lidas bem com isso?

Sim. Eu olho para isto como um desafio. Seria muito mais lógico que fosse ao contrário: que eu tivesse as minhas oportunidades de trabalho aqui em Portugal e que isso depois me levasse, pontualmente, a ter trabalhos lá fora... Mas parece que é ao contrário. Só depois de ter mostrado trabalho no estrangeiro é que tenho oportunidades cá. E atenção não estou a dizer que quero ser famoso. Eu adoro estar no meu cantinho e passar na rua despercebido, sem nada de alaridos ou festas ou cocktails, mas o reconhecimento e o respeito pelo meu trabalho... É isso que sinto que tenho vindo a conquistar e é só isso que me preocupa verdadeiramente.

Sentes alguma mágoa por imaginar um futuro que passe mais por trabalhar lá fora?

Eu gosto muito de trabalhar em Portugal. Na verdade, não me entristece não ter tanto trabalho em cá. É como as coisas são e eu lido bem com elas assim. Quer queiramos, quer não, o mundo das artes do teatro, do cinema e da televisão no nosso país, é como é: muito fechado! É assim que as coisas são e a maneira que fui arranjando para contornar as coisas, foi ir arranjando uns trabalhos lá fora e estar numa companhia de teatro que me permite a internacionalização e tudo o que isso traz de bom. Se me perguntarem se quero fazer uma telenovela em Portugal, eu não vejo nenhum problema. Se o produto e a personagem forem interessantes e me disserem alguma coisa, faço-o com o mesmo empenho que um filme internacional. Ou seja, não existe mágoa. Percebo que são escolhas e que é como as coisas têm acontecido. O meio é como é.

Já desvendaste um bocadinho do que estás a fazer e de onde te imaginas daqui a 10 anos, mas nos próximos meses, o que é que vais estar a fazer?

Estou muito concentrado nesta peça, o Macbeth. Temos sempre de ensaiar antes de irmos para um novo destino. Entretanto vou entrar em preparação mais a fundo para uma personagem que vou fazer. Será numa curta-metragem gravada em fins de julho, inícios de agosto. É um personagem que é muito, muito desafiante. Tem um intervalo de idades entre os 18 e os 40 anos e move-se no meio do hip-hop e do rap.

Vai ser gravada em Portugal?

Sim, na Cova da Moura. Vai ser um processo interessante. Além disso, em setembro estreia o filme do Vicente Alves do Ó, Al Berto. E também em setembro começo as gravações de uma série para a RTP. Será uma comédia.

Lá está, mais uma vês, estarás a trabalhar em teatro, televisão e cinema.

Sim... Isso vai acontecendo com frequência.

Referiste o filme Al Berto que está quase a estrear. Como é que correu esse trabalho?

Correu muito bem. Eu sou um ator que gosta muito das transformações físicas e então tive de deixar crescer muito o cabelo e a barba. Foram seis meses. Acabei por ficar com um bigode bem farfalhudo e com uma farta cabeleira. Foi um trabalho diferente... Tive de fazer algumas cenas que não exigiam muito, mas eram mais delicadas porque eram cenas de beijo homossexual e contacto físico. Como qualquer cena íntima, tem de ser feita com muito cuidado. Estamos a lidar com as fragilidades dos atores. Foi muito bom. Correu tudo lindamente. Além disso, sei e posso garantir que aquele filme foi feito com muito amor e com muita fidelidade. Há ali muitas personagens que ainda estão vivas. Mesmo as que não estão vivas, existiram mesmo. É uma história biográfica. Foi um filme feito com muita paixão e muito amor... O resultado vai ser interessante, de certeza. Foi uma bonita história de amor feita com muito amor.

Agora conta-me, quem é o Duarte Grilo?

[gargalhada] Quem é que eu sou? Agora é que me tramaste! [risos] Ora bem... isto é muito difícil. Eu continuo a ser um miúdo que cresceu na rua, jogou à bola descalço, andou de bicicleta com os amigos das 8h da manhã às 8h da noite, que nunca teve playstation, que aprendeu a brincar com paus na terra e a trepar às árvores. Eu sou uma pessoa que gosta muito das pessoas. Às vezes, erradamente fico em segundo plano para dar aos outros. Ultimamente cada vez menos, porque aprendo e a idade nos ensina a gerir isso. Mas sinto que sou uma pessoa que gosta muito de dar...

Este texto foi escrito ao abrigo do novo Acordo Ortográfico

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